segunda-feira, 29 de junho de 2009

Mensageiro

Vá. Conte que me conheceu no passado.
Fale que eu sou um jovem que não é mais tão jovem e que fora promissor, mas que me deixei seduzir pela mediocridade.
Diga a ela que talvez, com alguma insistência, possa se encontrar algo de bom em mim.
Sei que ela não acreditará, que nada que enxerga em mim pode lhe trazer interesse. Porém creio em seu poder de argumentação.
Fale do tempo antigo, quando conversávamos nas noites sem fim, quando havia mistério na bruma. Daquele tempo em que o mundo era desconhecido e podíamos sentir o crepitar da geada sobre nossos pés quando voltávamos pra casa.
Dirá ela que esse tempo não existe mais. Você afastara os cabelos do seu rosto.
Use aquele olhar que sempre convenceu. Se for preciso minta.
Puxe uma folha, faça um desenho, uma fórmula estatística talvez. Narre aquela história sobre o velho burguês condenado embora inocente, e que não viveu para conhecer a justiça.
Explique que não sou responsável pela malícia dos meus gestos. E que a malícia não é nada mais do que o desejo vulgarizado.
Quando, esgotados seus argumentos, você ainda encontrar indiferença naquele olhar, diga adeus. Conserve uma certa expressão de angustia, mas não muito forte. Vire-se a caminhe, não sem voltar a face, com um leve sorriso melancólico, a uns cinco passos de distância. Depois não olhe mais.
Quando estiver distante o suficiente para saber que suas palavras só chegarão como sussurro, sem se virar, diga que estarei sempre esperando.
Volte, esqueça tudo isso, e não me conte o que aconteceu.

5 comentários:

Unknown disse...

É melhor nem ir.

Michele Matos disse...

Deve ir, voltar e contar tudo. Nem que doa. A gente vive pra isso.

Eu sabia que existia um blog seu aqui na blogosfera, mas nunca tinha encontrado,sorte que ele foi divulgado em alguma rede social, agora salvei nos meus preferidos.

Obrigada meio-ermão, o Parafusos e Nostalgias sente-se honrado pela sua visita.

disse...

Mas é preciso contar, divulgar o que aconteceu, mostrar que mesmo sem obter um bom resultado tentou-se ao menos uma vez.

fix me disse...

caramba, que texto bacana, fácil de fazê-lo sentir num ar de perda de esperança. (talvez hehe).

abraço Xico!

Scheyla disse...

Gostei daquela parte: "uma fórmula estatística talvez". Isso talvez convencesse, mas não por muito tempo. Bem bom o texto.