quarta-feira, 16 de setembro de 2009

Noir Universitário - Parte 4

Quinta-feira, 21 de maio. Como havia combinado, encontrei o Manué no hoje extinto RU. Ele me trazia notícias inquietantes. Não havia nenhuma Minerva cadastrada no arquivo de alunos, nem em Nutrição nem em curso algum. Em compensação, a feiticeira celta aparecia: Morgana Magalhães, acadêmica do primeiro ano de nutrição. O endereço e o telefone conferiam com o que ela tinha me passado. Alguma coisa não cheirava bem nessa história!
No quarto de Minerva, no dia anterior, eu havia encontrado uma agenda onde constavam telefones, sobretudo de rapazes. A maioria pertencia aos cursos de agronomia e veterinária. Também encontrei algumas fotos. Reparei que não eram fotos reveladas, mas impressas em papel comum, o que me fez pensar que eram de uma máquina digital. As fotos continham datas recentes, de um mês ou um mês e meio atrás. Com muita insistência, e algum suborno – nesse caso algumas revistas em quadrinho antigas – convenci o Manué a me deixar acessar, após o horário de serviço, o arquivo de fotos dos alunos, no Lyceum, sistema de controle da universidade. Ali pude comparar as fotos que eu tinha e eleger alguns suspeitos, dois para ser mais preciso. Os nomes das fotos conferiam com alguns telefones da agenda.
Nas paredes da universidade fiquei sabendo que haveria uma festa no sábado, em uma república do CEDETEG. Eu teria dois dias para compor o personagem do meu disfarce, se quisesse encontrar alguma informação.

Sábado, 23 de Maio. Eu tinha faltado a aulas importantes na quinta e na sexta para melhor me preparar. Mas agora pensava estar pronto. Não conhecia ninguém que fazia curso de veterinária ou agronomia, porém a fama desse pessoal era bastante divulgada. Para nós, dos cursos de Humanas, eram os temíveis agroboys, criaturas lendárias cujo estereotipo era difundido nos mais remotos cantos. Baseando-me nessa fama construí o meu disfarce.
Passei os dois dias anteriores decorando o nome de pelo menos 25 duplas sertanejas atuais, e seus respectivos únicos sucessos. Também me mantive informado sobre diferentes raças bovinas, sobre a cultura do cereal da estação, sobre os carros mais populares do momento. O outro assunto pertinente eram as mulheres, mas sobre isso eu sempre estava informado, Para encerrar, decorei e ensaiei a interpretação de pelo menos quatro anedotas envolvendo o ambiente campeiro, duas envolvendo o proclamado sexo frágil (bem picantes), e mais duas racistas, caso a ocasião pedisse.
Na sexta feira compus minha indumentária: com um amigo consegui uma cinta com fivela bem grande, onde apareciam algumas colinas e um peão correndo atrás de um boizinho. As botas e o chapéu de aba bem larga, cujas laterais se retorciam para cima, eu tive que alugar em uma loja country, onde assinei uma promissória que depois repassaria a Morgana. Treinei um sotaque que misturava alguma coisa do interior de São Paulo e Mato Grosso do Sul, falando sempre o os “R’s” bem puxados.
Da minha convivência universitária eu tinha a certeza de três coisas: 1) os calouros de um curso raramente conhecem alguém do quarto ano; 2) os formandos de um curso raramente se lembram de alguém dos outros anos. 3) nas festas universitárias se formam patotas sempre classificadas por ano de graduação. Dessa maneira, na festa, eu seria calouro ou formando, de veterinária ou agronomia, conforme a ocasião pedisse. Decorei perguntas comprometedoras para inquirir meus alvos quando os encontrasse.
Curiosamente as coisas não ocorreram como planejei. As 23:30 cheguei na republica determinada, apresentei o ingresso caro, que também ficaria por conta da minha cliente. A festa prometia cerveja grátis a noite toda, porém eu havia me preparado com algumas doses de Jamel com Fanta, para poder atuar de forma descontraída. Logo na entrada estranhei o fato de eu ser a única pessoa de chapéu e camisa xadrez, fato que atraia bastante a atenção para a minha pessoa. A republica era uma casa de madeira no fundo de um grande terreno, havia vários grupos de pessoas formando rodinhas, uma pickup com um som bem alto e carregada de barris de chope era o centro da atenção. Na varanda da casa, alguns acadêmicos se divertiam arremessando calouros dentro de um freezer cheio de gelo. Tocava um Funk!
Me aproximei dos grupos, todos me recebiam com uma enorme euforia, o que eu não entendi direito. A Jamel produzira em mim um ar de descontração que me permitia me integrar facilmente. Sempre que o assunto masculino se encaminhava para o quesito mulheres eu dava um jeito de emendar: - Mas por onde anda a Minerva, aquela gostosa? – Algumas vezes obtive respostas interessantes como: - Pois é, realmente não vejo ela a algum tempo. Isso significava que a moça realmente freqüentava tais ambientes.
Quase no fim da noite, com o intelecto já avariado pela cerveja, me encontrei junto a um grupo onde reconheci um dos meus suspeitos, Miguel, acadêmico do terceiro ano de agronomia. Ele estava em uma das fotos com Minerva. Naquela hora o meu pretenso sotaque paulista já estava bastante desenvolvido. Eu terminava quase todas as frases com um grito estridente: Iiiiiiiiiiiihhhaaaaa!!! O que não deixava de causar divertimento entre meus interlocutores. Além disso, de repente surgiam em meu vocabulário, do nada, expressões multiregionais, como Ô trem bão!, Bah Tchê, e até Cabra da Peste!.
Mas em meio a esse show de interpretação eu ainda pude mandar a pergunta programada sobre Minerva, e ela gerou um efeito interessante. Miguel fechou a cara imediatamente, se afastou da roda e começou a cochichar algo com outro cara que eu não reconheci. Logo se afastou rapidamente. Em meio aos humores da bebida resolvi segui-lo, e foi quando algo totalmente inesperado aconteceu: enquanto eu perseguia Miguel, ao lado de uma das paredes da casa de madeira, uma figura me chamou nas sombras – Ei detetive, creio que posso ajudá-lo.
Quando eu me virei vi uma alta mulher quase encoberta pelas sombras. Trajava uma capa que não me permitia vislumbrar suas formas. Os cabelos loiros desgrenhados pelo vento guarapuavano e a sombra não permitiam que eu enxergasse seu rosto, apenas o brilho dos seus olhos.
Antes que eu pudesse me aproximar ela falou rapidamente: - Eu sei o que você procura. Encontre o Japonês que conserta binóculos e encontrará a resposta. – Logo em seguida desapareceu nas sombras deixando um rastro de perfume. Antes que eu pudesse persegui-la notei a presença de Miguel do meu lado. O soco que ele me deu em seguida foi o suficiente para me tirar os sentidos por alguns minutos. Quando dei por mim, na festa só havia o resto da turminha da maconha. Me arrastei lentamente para a saída, desajeitadamente formulando quais seriam as próximas ações necessárias. Muitas perguntas pairavam na minha cabeça: Porque Miguel me bateu? Quem era a figura das sombras? Como me conhecia? Mas acima de tudo: Quem seria o misterioso Japonês que conserta binóculos?

(Continua...)

segunda-feira, 10 de agosto de 2009

Noir Universitário - Parte 3

Quarta-feira, 20 de maio. Acordo sobressaltado perto das 11 horas. Tinha ficado acordado até tarde na noite anterior, pensando em que rumo dar a estranha situação em que me metera. O meu vacilante senso de moral me impelia a ajudar aquela moça de alguma maneira. Aqueles olhos claros, aquelas palavrinhas rápidas e intermináveis tinham um quê de desespero. Em outra época eu teria descolado mais vinte reais e caído fora, mas agora era diferente. Eu só não entendia porque era diferente.
Depois de almoçar o velho macarrão com carne moída – prato requintado para universitários – resolvi botar em prática o plano que concebera na minha insônia. O bom de um dia ter sido estagiário em uma universidade é que você conhece pessoas, na maioria não as que mandam, mas as que fazem. Isso pode ser útil um dia. Por isso fui falar com o Manoel, um amigo meu que estagiava na Divisão de Apoio Acadêmico. O Manoel era um sujeito interessante, meio nerd, meio filósofo. Baixo e um pouco acima do peso ele me parecia o Jack Black usando óculos. Ele podia ficar horas conversando sobre qualquer assunto e de repente se calar, e sair sem te dizer nada. Eu nem entendia direito porque a gente era amigo. A verdade é que o Manué, como eu o chamava a contra gosto dele, tinha um pode incrível nas mãos: tinha acesso as informações de todos os acadêmicos da UNICENTRO. Coisas tipo endereço, informações pessoais, boletins e além. Se alguém podia me dar mais detalhes da Minerva enquanto acadêmica, era ele. O problema é que o cara era muito ético e não compartilhava nada disso, mas eu já tinha esquematizado a forma de coopta-lo.
Abordei o Manoel no corredor da universidade, perto de um banheiro, eu sabia o quanto ele era metódico e que fumava escondido sempre naquela hora.
- Fala Manué, e ai, como vai essa vida? – eu não tinha tempo a perder, então fui bastante objetivo, puxando uma nota de dinheiro do bolso interno do meu sobretudo apertado mandei: - Você ainda está interessando nessa minha nota de 10.000 cruzeiros pra sua coleção de coisa veia.
Os olhinhos dele brilharam por detrás das grossas lentes. Eu sabia que o Manoel colecionava coisas antigas, principalmente moedas e notas. A muito tempo eu tinha mostrado a nota que meu avô me dera e ele nunca parou de insistir pra que eu desse. Eu não tinha dado só de sacanagem, mas agora o caso exigia. Logo o Mane se convenceu, no outro dia me traria tudo que pudesse levantar sobre a tal Minerva, e também sobre Morgana.
Eu saí da universidade e de um telefone público liguei a cobrar pro celular da Morgana. Queria combinar uma visita a casa dela, para levantar possíveis pistas no quarto da desaparecida, coisa que qualquer detetive que se preze faria. Felizmente ela tinha crédito e me atendeu. Achei sua voz estranha, mas combinei a visita pras 5 horas, pra dar tempo de eu verificar quais os ônibus eu teria que pegar pra chegar até lá. Os passes seriam por conta da cliente.
Depois de pegar dois ônibus cheguei em meu destino, uma pequena casinha de fundo de quintal nos arredores do CEDETEG. Me atendeu uma velha meio surda e foi difícil explicar quem eu era pra poder passar para os fundos. Vencido esse obstáculo, bati na porta de Morgana. Ela me atendeu usando pijamas, achei estranho aquela hora mas não falei nada, tinha algo de nervoso nas suas palavras:
- Ah, é o senhor, digo, você, entre por favor. Eu estava dormindo, é que pra me sustentar no curso eu tenho um emprego a noite. Sabe como é né, a gente vem do interior, não tem família rica, então tem que se virar como pode. Mas que cabeça a minha né, não fiz nem um café pra te hospedar. Mas já coloco uma água pra esquentar. Você gosta de chá...
- Não se incomode Morgana, só quero dar uma olhadinha no quarto da vitima, quero dizer, no quarto da sua amiga pra ver se encontro algo importante.
Sem parar de falar um minuto ela me conduziu para o quarto menor da casa, que era de Minerva. No quarto havia apenas um colchão de casal no chão, alguns cabides com roupas penduradas em uma espécie de varal. Cartazes de festas antigas colados nas paredes eram a decoração, em um canto se viam sapatos, livros e xérox amontoados. Algumas caixas empilhadas completavam o mobiliário. O quarto destoava bastante do da amiga, completamente mobiliado, que pude ver na passagem. Olhei os livros, os xérox, nada interessante. Examinei as caixas, uma continha lingeries, outra meias. Uma caixa de sapatos que estava bem embaixo me interessou mais. Lá havia fotos com várias pessoas, sobretudo rapazes, alguns bilhetinhos e cartões de amor, e um caderno com telefones e anotações. Convenci Morgana a me deixar levar as fotos e as anotações para um futuro exame. Na saída eu consegui decifrar: seus cabelos eram castanhos.
Uma rápida olhada nas anotações foi o bastante para eu entender qual seria o próximo passo. Eu teria que trabalhar disfarçado, e já sabia de que e onde.


(Continua...)

segunda-feira, 27 de julho de 2009

Entre Pinchers e Vampiros

Aqueles que convivem comigo há algum tempo já devem ter me ouvido contar, talvez uma, duas, ou mais vezes, a história da minha própria entrevista com um vampiro. É uma história que vez por outra surge na mesa de bar. Gosto de contá-la porque não sou uma pessoa que acredita no sobrenatural, e também nunca vi muita coisa estranha (corrijo, nunca vi muita coisa cientificamente inexplicável, coisa estranha vejo todo dia). É por isso que esse vampirinho me fascina e nunca me saiu da memória. Resolvi, pois, apresentar a historieta ao mundo digital.
Fazia poucas semanas que eu me instalara definitivamente em Guarapuava, no terceiro ano da faculdade, como estagiário em um departamento da UNICENTRO. Morava sozinho pela primeira vez na vida, em uma kitinete cheia de lesmas. Como a maioria dos jovens que já estagiaram na UNICENTRO, tive a sorte de estar em um departamento que me permitia uma abundante carga horária dedicada a fuçar na internet. Internet que na época eu começava a conhecer, e era moda! Então eu navegava horas inteiras investigando sites dos mais diversos assuntos. Poucos anos antes mal sonhava eu em ter acesso continuo àquilo que viria a ser o oráculo do terceiro milênio.
A vida de um estagiário do interior que mora sozinho é bem solitária no fim de semana (na verdade eu morava com o Bill, mas ele quase nunca aparecia). Nesses momentos de solidão, sem internet em casa (nem existia banda larga na época) me restavam os livros e os filmes. Eu nunca tinha ido ao cinema, e na época o único existente em Guarapuava ficava dentro da UNICENTRO e passava alguns filmes comerciais com semanas de atraso. Naquele sábado resolvi arriscar uma seção. Caminhei pela calçada a quadra que separava minha kit da universidade, a noite estava calma e voltavam pessoas da missa.
O filme em cartaz era Encontrando Forrest, um drama sobre um velho escritor e seu pupilo adolescente, estrelado por Sean Connery, que eu nunca assisti inteiro. As cem cadeiras que compunham a sala de projeção estavam quase desertas. Alguns casais de namorados se amassavam nas filas do meio, resolvi sentar na ultima. Pouco antes do filme começar, com as luzes já apagadas, notei um vulto que se sentou na mesma fila que eu, porém no canto oposto.
Lá pela metade o filme, que estava até interessante, houve problema na película. Travou tudo, as luzes se acenderam. Enquanto eu maldizia a minha precária estréia como cinéfilo reparei na figura pálida na outra extremidade da fila (hoje posso jurar que era muito pálida). Ele me olhou com os olhinhos brilhantes, sorriu e perguntou a hora, meio sem jeito. Acho que queria puxar conversa, mas eu nunca fui muito simpático: disse a hora e me calei. O filme voltou, retomei o interesse, mas passados uns 15 minutos emperrou de vez. Um senhor simpático que cuidava do cinema (mais tarde vim saber que era o Seu Moreira) veio pedir desculpas a diminuta platéia. Ingressos seriam distribuídos na saída para vermos o filme em uma outra sessão, se voltasse a funcionar. Quando saí nem reparei na ausência prematura do meu companheiro de fila, peguei o ingresso que jamais usaria e comecei percorrer pensativo o caminho de volta.
As poucas pessoas que estavam no cinema se dispersaram rápido na saída, e eu me encaminhei sozinho de volta pra casa. A noite continuava serena, estrelada, eu ouvia os ecos da conversa e sentia o cheiro da carne de algum churrasco que ocorria por perto. Quando toquei a maçaneta do portão para entrar em casa a figurinha pálida estava do meu lado. Ele era magro e baixinho, usava calça jeans normal e uma jaqueta preta, que, agora me parece, tinha a gola um pouco protuberante. Tinha cara de cachorro pincher, magricela e com os olhos e os dentes saltados. Eu me assustei é claro, e ele se desculpando me perguntou se eu não sabia de alguma kitinete pra alugar, era de Santa Catarina e queria um lugar pra morar com a irmã. Um pouco contrariado informei-o que ali por perto havia algumas kitinetes e que bastava ele falar com o meu senhorio, que residia logo ali do lado. Dito isso me despedi, abri o portão e entrei pelo estreito corredorzinho que conduzia ao meu quarto.
Quando abri a porta e acendi a luz, a figurinha pálida estava do meu lado. Hoje a minha memória não permite mais lembrar os pormenores da conversa que ele puxou naquele dia. Mas eu fui suficientemente educado para convida-lo pra entrar, e ele pediu pra jogar paciência no meu PC enquanto eu fritava um ovo. Me contou muitas coisas, acho que tinha passado em ciências contábeis, era novo ali. Conversamos mais de uma hora, e não demorou muito pra eu perceber que todos os assuntos de que ele falava eram do meu interesse: filmes, gibis, desenhos animados, filosofia e...vampiros. Quando ele adentrou ao ultimo assunto eu percebi que era um perito. Começou a me contar detalhes do mito que me eram estranhamente conhecidos. Pára tudo!
De repente tudo me veio a mente, no mesmo momento em que minhas pernas começaram a tremer. Nas semanas anteriores, nas minhas infindáveis viagens de exploração ao mundo digital, um dos assuntos em que eu me havia detido era justamente o mito dos vampiros. Vários sites contavam lendas sobre a origem das criaturas, as diferentes espécies, as características e os hábitos. O dono de um dos sites dizia ser ele próprio um vampiro, espalhando os segredos para o mundo. De tão entusiasmado com a hilariante situação eu havia até mandado um e-mail pra ele, pedindo que me provasse...
E agora eu estava ali, sentado frente a frente com aquela criatura pálida e pequena que não parava mais de falar de vampiros. Não sei se ele notou o meu medo, a minha paralisação. Falou do assunto mais uns quarenta minutos. Fiquei sabendo de pormenores que não ouso compartilhar. E quando eu só esperava o momento em que os dentes começariam a crescer e ele me atacaria, educadamente pediu a hora, disse que era tarde, estava com fome e precisava ir. Gentilmente se despediu e saiu. Nunca mais o vi.
O encontro ficou semanas na minha cabeça. Não voltei a visitar sites sobre vampiros. Dormia com a luz acesa. Ficava me perguntando se ele seria mesmo o enviado para por o meu ceticismo a prova, ou apenas uma grande, uma colossal coincidência. Hoje tenho certeza que era um vampiro, e só penso uma coisa: por que não me mandaram uma vampira fatal no lugar do pincher? Talvez hoje eu fosse imortal.

quarta-feira, 15 de julho de 2009

Noir Universitário - Parte 2

Terça feira, 19 de maio. As 22:50, logo que saí da aula, me encaminhei para o local que estipulara para o encontro da minha primeira cliente em potencial. A noite estava fria, uma leve bruma descia sobre a Praça da UNICENTRO, minúsculas gotículas de água lampejavam como brilhantes nas roupas e nos cabelos do pessoal que esperava o ônibus. O inverno já começava a se pronunciar, como em geral se pronuncia todos os meses em Guarapuava. Mas não estava frio o suficiente pra evitar o calor que eu sentia com aquele velho sobretudo de lã, um tanto quanto apertado, que a muito custo consegui emprestar de um colega. O Toty´s estava semi-deserto, como era natural nas terças-feiras quando se aproximava as 11 horas. Me sentei sozinho numa mesa em um canto, posicionando-me de forma a poder ver o ponto de ônibus de fronte à universidade através dos plásticos que servem de paredes. Fiquei pensando em que bebida pedir que me pudesse atribuir alguma elegância. Demorei pra decidir, um pouco de propósito, pois o dinheiro que eu tinha não dava pra ficar bebendo até ela chegar. Depois de 20 minutos pedi uma dose de Wiski, do mais barato.
As 23:35, aproximadamente, vi o vulto amarelado do ultimo ônibus que vinha do terminal, cujo letreiro da frente alternava Santa Cruz e Jordão. Os garçons do Toty´s já me olhavam com inimizade, enquanto bocejavam. Só restava no bar, além dos garçons e eu, dois acadêmicos de filosofia, que embriagados discutiam com veemência se a dialética era ou não invenção de Hegel.
O ônibus parou, percebi uns cinco vultos que se moveram na bruma que se adensara. Só um tomou a minha direção. Sem eu saber por que, meu coração acelerou. Discretamente abri o livro que estava segurando em uma página qualquer e fingi que lia com interesse. Mas quando ela entrou, por um buraco lateral das cortinas de plástico que envolviam o Toty’s, não pude deixar de baixar o livro.
Tinha estatura mediana, devia andar pelos seus 20 anos , no máximo. Tinha um corpo bonito, nem exageradamente gordo nem magro demais, onde se destacava o largo quadril. A silhueta do corpo era realçada por uma calça jeans justa que terminava sorrateiramente adentrando em umas botas longas, como era moda na época. A vestimenta se completava com um casaquinho vermelho, transpassado, estilo social, que na verdade em nada combinava com o resto. O rosto, onde brotava um narizinho algo empinado, impertinente, tinha uma beleza exótica. Ela trazia nos olhos claros um suave estrabismo de gato siamês, que atribuía àquele olhar uma impressão de discreta estupidez, estilo Jennifer Aniston, que aos homens tanto agrada encontrar numa mulher. Uma grande boca fechava a composição. Pelas costas se derramava uma basta cabeleira, que o excesso de pinturas consecutivas me impedia de determinar a cor. Chegou apressada, meio sem jeito, como se procurasse algo. Após alguns giros pelo ambiente, seus olhos se fixaram em mim.
Surpreendido por um olhar tão enfático, tentei disfarçar com o livro, mas só consegui balança-lo para cima e para baixo pateticamente. Ela se dirigiu até mim, não reparou no sobretudo (felizmente) mas apurou o olhar para ler o titulo do livro. Sorriu:
-Ah é você, eu já estava desesperada pensando que não encontraria ninguém, que ninguém estaria disposto a me ajudar. Porque convenhamos, hoje em dia não se encontra mais esse tipo de profissional, disposto a auxiliar as pessoas. Na verdade eu nunca tinha visto um detetive particular pessoalmente. Se cruzasse com você na rua jamais pensaria que o senhor (devo chama-lo de senhor) fosse um...
Meu Deus! Como ela fala. Pensei eu, enquanto procurava organizar as idéias e formular alguma frase de efeito para entabular a palestra. Não sabia se deveria tratá-la de senhora, senhorita, madame, moça, resolvi chamar pelo nome, denotaria mais segurança.
- Bem Morgana, é um prazer conhece-la. Mas não percamos tempo com supérfluos, me conte logo o caso, digo, o que esta acontecendo, em que posso ajuda-la. – Quando comecei a falar me dei conta de que as duas doses de wiski barato que eu consumira de barriga vazia afetavam um pouco minhas palavras, que saíram arrastadas. Além disso, não sei porque, imprimi um tom anazalado ao discurso, provavelmente imitando algum detetive de filme. Isso não deve ter dado uma boa impressão.
- Então – começou ela – eu sou de uma cidade do interior e moro aqui faz alguns anos. No começo desse ano uma moça da minha cidade, Minerva, veio morar comigo pra tentar vestibular. A pedido da mãe dela eu fiquei responsável, porque ela nunca tinha estado numa cidade grande como Guarapuava. – enquanto ela falava e retirei do bolso interno do sobretudo uma pequena caderneta que eu usava pra anotar números de telefone e fingi que rabiscava algo nela com uma caneta sem tinta. – Ela se adaptou rapidamente a vida na cidade – prosseguiu ela - fez muitos amigos, circulava em todas as tribos, era muito extrovertida a menina. Várias vezes por semana ela ia nas festas das republicas lá do CEDETEG e chegava de madrugada com dois ou três amigos novos. Eram rapazes bacanas! Mas há mais de uma semana ela saiu em uma noite e não voltou mais...
Ela falou por mais uns 40 minutos, expondo alguns detalhes e respondendo pequenas perguntas que eu fazia. Tomei devidamente nota mental de tudo, e pouco antes de nos despedirmos, falei no assunto que me interessava.
- Esta tudo muito bem. Amanhã mesmo procederei o início das investigações. Meus honorários, para você, vão ser de vinte reais por semana, mais os materiais que eventualmente eu precisar. Eu prefiro pagamento adiantado. – A voz irritante persistia.
- Ah, senhor, por favor, me desculpe, mas agora não tenho essa quantia. Mas posso te trazer amanhã sem falta?
- Tudo bem, no seu caso eu posso esperar. Mas você não teria cincão pra eu poder pagar o Toty’s?
Ela remexeu nos bolsinhos do casaco e retirou algumas notas amassadas. Me senti um pouco vigarista, mas fiz uma promessa pra mim mesmo de ajuda-la da melhor forma. Depois disso ela se levantou, ensaiou um abraço desajeitado de despedida, mas não chegou a dar. Saiu e desapareceu na bruma, atravessando a praça. Fiquei meditando um pouco, até que o garçom educadamente sugeriu que eu me retirasse, pois não havia mais ninguém ali e eu não estava consumindo nada. Paguei a conta com os trocados, e sai, descendo vagarosamente a rua da UNICENTRO. Meus pensamentos voavam longe, amanhã seria o dia...o dia em que eu estrearia em meu primeiro caso como detetive particular. Em pleno século XXI.

(Continua...)

terça-feira, 7 de julho de 2009

Noir Universitário

Terça-feira, 19 de maio. O celular me acorda às 10:17 da manhã. A música estridente ecoa no fundo do meu ser desbaratinado. Com os olhos entreabertos observo sombras de livros, xérox, calçados e roupas pelo chão, em um mosaico desconexo.
- Alô, estou ligando por causa de sua nota no jornal de negócios. Não sabia que ainda existiam detetives particulares, ainda mais em Guarapuava. Quero deixar claro que não levo muita fé nisso, mas estou desesperada e não tenho mais a quem recorrer...
Outras palavras mais soaram, oriundas do outro lado das ondas do celular, e minha mente, ainda semidormente, fazia um preguiçoso esforço pra entender que loucura era aquela. Ah! Puxa vida, aquele anúncio no jornal de negócios!
A voz continuava: - Então, é que minha amiga, minha colega de kitinete, (vou logo dizendo que não tenho muito dinheiro), então, ela sumiu, faz uma semana que saiu e não voltou mais, não deu noticias, a família dela já me ligou perguntando...
Ai que ressaca, pensava eu. Será possível que alguém é boçal o suficiente pra levar aquilo a sério? Eu tinha, numa dessas muitas tardes sem nada pra fazer, colocado um anuncio no jornal de negócios. Era mais por farra. Na verdade estava desesperado, precisando de grana e não sabia de onde tirar. Só depois de feito eu tinha pensado em o quanto aquilo era idiota. Detetive Particular! Ia ser motivo de chacota pra muita gente. No entanto resolvi falar alguma coisa, afinal a voz da moça traía um certo nervosismo. Se fosse um trote, ela fingia muito bem.
- Eh, ã, por favor, quem está falando? Você poderia falar mais devagar?
- Ah, me desculpe, é que estou muito preocupada. Me nome é Morgana, sou acadêmica de nutrição na UNICENTRO. Por favor, você pode me ajudar? A minha colega sumiu e eu não faço idéia do que pode ter acontecido.
Morgana?! Será que a mãe dela era fã da Marion Bradlay ou fez só pra sacanear? Eu não sabia o que dizer, mas resolvi dar corda:
- Você já tentou a polícia Morgana, talvez seja mais indicado pra um caso assim. Na verdade minha especialidade são infidelidades conjugais – pensei isso na hora.
- Claro que eu já tentei a polícia, ou você acha que eu ligaria pra um desconhecido excêntrico por qualquer bobagem. Fizeram pouco caso, disseram que é normal acadêmicas interioranas desaparecerem por semanas em aventuras amorosas. Ai, nunca fui tão humilhada. E a mãe dela que sempre me achou tão responsável. Ah, estou perdida...
As palavras infindáveis continuavam ressoando na minha cabeça, mas naquela altura eu já estava realmente com pena da moça, resolvi tocar adiante. Afinal, no curso de história a gente aprende alguns procedimentos de investigação, e vai que eu levo jeito pra coisa. Em último caso, pelo menos as turmas de nutrição eram famosas por conterem acadêmicas bonitas.
- Bem Morgana, acho que não devíamos entrar em detalhes por telefone, temo por nossa privacidade – não sei de onde tirei aquilo – então o que você acha de nos encontrarmos mais tarde, talvez num barzinho perto da UNICENTRO. Você pode vir?
Ficou decidido, às 23:30 no Toty´s, pra ela ter tempo de pegar o último ônibus que vinha do CEDETEG. Eu vestiria um sobretudo cinza e estaria sentado sozinho, lendo um livro chamado BRIDA, com título grande e dourado. Juro que me ocorreu pensar uma senha para abordagem, mas achei meio fora de moda.
Tentei voltar a dormir mas o assunto me ficou na cabeça. Depois dormi. A tarde, quando levantei, deparei-me com novo problema: eu não possuía um sobretudo cinza.

(Continua...)

segunda-feira, 29 de junho de 2009

Mensageiro

Vá. Conte que me conheceu no passado.
Fale que eu sou um jovem que não é mais tão jovem e que fora promissor, mas que me deixei seduzir pela mediocridade.
Diga a ela que talvez, com alguma insistência, possa se encontrar algo de bom em mim.
Sei que ela não acreditará, que nada que enxerga em mim pode lhe trazer interesse. Porém creio em seu poder de argumentação.
Fale do tempo antigo, quando conversávamos nas noites sem fim, quando havia mistério na bruma. Daquele tempo em que o mundo era desconhecido e podíamos sentir o crepitar da geada sobre nossos pés quando voltávamos pra casa.
Dirá ela que esse tempo não existe mais. Você afastara os cabelos do seu rosto.
Use aquele olhar que sempre convenceu. Se for preciso minta.
Puxe uma folha, faça um desenho, uma fórmula estatística talvez. Narre aquela história sobre o velho burguês condenado embora inocente, e que não viveu para conhecer a justiça.
Explique que não sou responsável pela malícia dos meus gestos. E que a malícia não é nada mais do que o desejo vulgarizado.
Quando, esgotados seus argumentos, você ainda encontrar indiferença naquele olhar, diga adeus. Conserve uma certa expressão de angustia, mas não muito forte. Vire-se a caminhe, não sem voltar a face, com um leve sorriso melancólico, a uns cinco passos de distância. Depois não olhe mais.
Quando estiver distante o suficiente para saber que suas palavras só chegarão como sussurro, sem se virar, diga que estarei sempre esperando.
Volte, esqueça tudo isso, e não me conte o que aconteceu.

quarta-feira, 17 de junho de 2009

A última testemunha da noite

A noite deixará de existir.
Existe uma antiga questão filosófica: se as árvores caem na floresta, e não há ninguém para vê-las cair, será que elas caem mesmo? A pergunta retórica deriva da noção de que o mundo só existe a partir de uma percepção inteligível. De acordo com essa noção o fenômeno só existe a partir da observação e interpretação do ser.
Eu poderia me deter em várias refutações materialistas para tentar estabelecer a dimensão objetiva e independente da realidade, porém quero fazer o contrário. Para explicar o contexto que me aflige quero partir da veracidade da noção explicitada acima.
Acho que sou o que resta da boemia, portanto posso falar com propriedade. A cada dia vejo a noite se esvaziar. Vejo aquele ambiente que sempre foi criador, contestador, sedutor, desafiador, dia após dia, mês após mês, definhar.
Estamos perdendo a noite. A noite das serestas, das serenatas, dos feitiços e dos romances, dos poemas e dos mistérios. Estamos perdendo a noite para a ignorância. Com a noite perdemos toda uma fauna própria. Há criaturas que só vivem a noite. Perdemos a democracia dos bares, onde todo conhecimento é compartilhado.
Pra onde foram os poetas de alma aberta? Onde se cantam as canções que não toleram a luz? Pra onde voaram as feiticeiras e suas vassouras? Aonde chora suas mágoas a boemia de outrora? Mesmo os simpáticos demônios que negociavam almas não se encontram mais.
Aos que se arriscam a observar, só resta na noite seres desprovidos de qualquer racionalidade, violentos e mesquinhos. E mesmo estes são raros. Reformulo pois a questão retórica: se a noite existe, e não há ninguém para vivê-la, continuará ela existindo? Para mim sim, mesmo que eu seja a sua última testemunha.

quarta-feira, 6 de maio de 2009

Manhã de Garôa

Ploc ploc ploc! Caminhava apressadamente - que sempre estava com pressa – pela calçada ligeiramente molhada. Observava os fumantes na parte de fora dos estabelecimentos, todos com aquela mesma postura, cabeça soerguida, como se pudessem assoprar a fumaça para outras paragens. Mas isso definitivamente não o interessava. Nem a calçada, nem os estabelecimentos, muito menos os fumantes e suas fumaças. Havia algo de mais amargo naquela manhã. Mais do que o gosto na garganta da bebida da noite anterior. Algo agora fazia menos sentido do que antes (não que antes fizesse muito sentido). Seria o outono? Mas há tempos que pra ele todas as estações eram outono. Havia algo mais, algo de mais sério, algo de mais grave, algo de mais triste. Lembrava-se da frase de Pessoa: “A metafísica é uma conseqüência de se estar indisposto”. Lembrava-se também que conseqüência não tinha mais trema. E de nada mais se lembrava. Atravessou a rua, apressadamente, cogitou se deixar atropelar por aquele Corcel II azul geladeira, mas seguiu a vida. A tarde o sol apareceu.

quarta-feira, 29 de abril de 2009

Desabafo

Tudo bem. Eu posso estar fora de moda! Mas sou do tempo em que se combatiam superstições. Sou do tempo em que se podia distinguir o certo do errado, e mais, se podia optar por um deles. A gente acreditava no bem e no mal, e acreditava poder diferenciá-los. Depois veio a aclamada pós-modernidade, o relativismo, e a verdade deixou de existir. Eu sou de um tempo em que se achava possível optar por um caminho melhor. Em que se acreditava no poder da razão de defender as coisas humanas. Mas já vai longe, hoje tudo é certo, tudo é normal. È uma bela maneira de isenção, se tudo é relativo posso me eximir de qualquer participação, afinal, nunca somos nós a decidir, tudo é acaso, tudo é acidente...Centremo-nos pois em nossas mediocridades. Deixemos pois que tudo siga seu curso relativo...

segunda-feira, 27 de abril de 2009

Subversão

...e aquele passaria a ser conhecido como o dia da vingança!
Os temíveis proletários dos quais nos advertira Marx uniram-se, venceram e festejavam a destruição de tudo que havia de sagrado.
Deus Todo Poderoso, lá dos céus, pensou em intervir, para restabelecer a ordem das coisas, mas teve medo de por os pés na terra. A criatura, pela primeira vez, criara consciência e se sobrepunha ao criador. Deus resolveu deixar-lhes em paz e foi passear em outros prados (e isso é uma outra história).
Enquanto isso, sem que os proletários, embriagados de champagne e propriedade, percebessem, algo de mais estranho acontecia no mundo: as coisas, espantadas com o novo, perceberam que também tinham direito de reivindicar a subversão.
As raízes das árvores despontavam para o sol enquanto as formigas cantavam a sua sombra. As bestas do apocalipse, preocupadas em se fazer notar, corriam como cachorrinhos entre os transeuntes desinteressados, enquanto os semáforos piscavam em cores mil.
Epílogo: naquela noite, todos os rabos enforcaram seus gatos.

terça-feira, 7 de abril de 2009

Sobre a arte!

A alma mais desprezível ainda se regozija ao contemplar o belo! Mas cadê o belo nessa maldita arte moderna? Tudo é arte, blá, blá, blá. Isso é uma invenção do pensamento burguês para minimizar a sua própria obtusidade! E tem o dito!

Epílogo

No momento em que a raça humana deixara de existir, a tecnologia havia chegado ao seu auge. Tudo era sem fio, tudo era infravermelho, tudo era blue tuth, tudo era wireless. Turbilhões de informações giravam em ondas invisíveis por sobre os cadáveres cada vez menos frescos.
As ondas de informações sobreviveram aos seus criadores nas ondas de rádio, nos discos magnéticos, na fibra ótica...Aqueles blogs e suas futilidades, e suas mediocridades...viveram para sempre!

O Incrível homem que parou de pensar

Procurava lembrar. Em que momento? Em que momento deixara de pensar? Ainda se sentia racional, mas não de uma racionalidade completa. Para ele, raciocinar era um ato criativo. Mas desde quando deixara de criar?
Havia algum tempo começara a perceber algo diferente na sua maneira de pensar. Diferente da forma como seus pensamentos fluíam antes, na juventude.
Havia fertilidade no passado! Criava teorias, refletia, argumentava, convencia.
Em algum momento da sua vida começou a repetir idéias. As informações giravam em circulo na sua cabeça, se recombinavam. Mas as idéias novas começaram a rarear, cada vez mais. Em pouco tempo se tornou um papagaio de si mesmo, vivendo a repetir velhas sentenças. Máximas, que em algum lugar distante da sua vida tinham sido originais, mas que agora eram mero reflexo.
Não desenvolvia mais suas velhas filosofias, e começou acreditar que suas meias respostas eram definitivas. Não buscou mais a essência das coisas, e cuidou ver a essência na mera aparência. Se fez douto na arte de plagiar a si mesmo. Parafraseava seu eu do passado tentando apresenta-lo com novas roupagens, como se fosse original. Mas a verdade é que a fonte secara. Tinha deixado de pensar!
Sua sorte foi viver nos tempo da epidemia. Dessa maneira ninguém percebeu. Só ele percebeu, e foi a ultima coisa que percebeu.